Lindelof era um roteirista estabelecido trabalhando na série Crossing Jordan quando se encontrou com Abrams pela primeira vez. Ele contou ao entrevistador Andrew Jenks, apresentador do World of Jenks na MTV americana, que sempre conversava com uma amiga que era executiva da ABC na tentativa de conseguir um trabalho na série de espionagem de Abrams, Alias.
Tempos depois, a executiva Heather Kadin o chamou em janeiro de 2004 dizendo que ele podia se encontrar com Abrams para falar sobre um projeto.
“A má notícia”, ele lembra dela falando, “é que se trata de um papo sobre uma ideia ridícula envolvendo um avião que cai numa ilha e que ninguém aqui acha que vá para frente. Mas Lloyd Braun, que era o presidente da ABC na época, queria fazer uma versão dramática do reality Survivor.”
Braun disse a Abrams que tinha um roteiro sobre um drama que se passava numa ilha, mas que ele tinha que trabalhar nele ‘fazendo sua mágica’, contou Lindelof. Ele disse que Abrams falou com Braun que estava muito ocupado, mas que poderia supervisionar tudo com outro roteirista.
“Portanto Heather disse que eu deveria me encontrar com J.J. porque aquele Piloto não daria em nada, mas me renderia um trabalho em Alias.”
O ‘problema’ é que o Piloto foi pra frente. Lindelof surgiu com um monte de ideias, incluindo narrativa não linear e flashbacks.
“O maior problema com uma série que se passaria numa ilha deserta, era que o público ficaria muito frustrado de não ver os personagens saindo de lá”, comentou ele. “Minha solução então foi dizer, ei, vamos sair da ilha toda semana. E vamos fazer isso através de flashbacks. Faremos um personagem de cada vez e como teremos uns 70 personagens na série, poderemos ir bem devagar e cada um basicamente mostrará quem eles eram antes do acidente e isso vai servir para dramatizar algo que esteja acontecendo na ilha o que fará com que a série se torne bem centrada nos personagens.”
Abrams gostou da ideia, e também teve outra: “Tem que existir uma escotilha na ilha! Assim eles passarão a temporada inteira tentando abrí-la. E devem existir outras pessoas na ilha”, Lindelof lembra de Abrams dizer. “E eu emendei, podemos chamá-los de ‘Os Outros’. E ele retrucou dizendo, “eles deviam ouvir um barulho vindo da floresta”. Perguntei que tipo de barulho e ele respondeu, “Sei lá, eles nunca vão transformar isso em série mesmo.”
Lindelof disse que a ideia de contar a história fora de uma ordem cronológica surgiu, em parte, por causa de Pulp Fiction, no qual o personagem de John Travolta é morto na metade do filme – e o público só descobre no fim que ele não prestou atenção no discurso do personagem de Samuel L. Jackson falando sobre o caminho do homem justo.
“Aquilo meio que despertou algo em mim, e era algo que eu realmente queria fazer como contador de história e LOST era a oportunidade perfeita para fazer isso”, disse Lindelof.
Abrams e Lindelof rapidamente escreveram o conceito geral e poucos dias depois, Braun deu sinal verde para o Piloto ser produzido. (O executivo seria demitido pouco tempo depois por ter liberado grana não apenas para LOST, mas também para Desperate Housewives, mas se sentiu vingado quando as duas séries viraram grandes hits. LOST, aliás, manteve-o sempre como parte da série ao fazer dele a voz que ouvíamos no início de cada episódio com o “Previously, on LOST”.)
Lindelof confessou que quase imediatamente se sentiu sobrecarregado por conta da responsabilidade de comandar a série e que repetidamente decidiu ou tentou abandonar o barco. Por volta do episódio 11, ele acabou convencendo Carlton Cuse, que havia sido seu chefe na série Nash Bridges, a aceitar o desafio de ajudá-lo a liderar a série.
Eu vivia, respirava e dormia pensando na série. E isso era tudo o que eu fazia. Algumas vezes eu acordava às 3 da manhã pensando no Jin, por exemplo”, revelou ele.
Ele disse que na época concordava com os críticos que diziam que a série nunca poderia durar mais que uma temporada.
“Se colocássemos a série no ar e dissessemos que havia um urso polar na floresta, era bom saber exatamente de onde o urso veio”, disse ele. “E essa pressão me consumia demais.”
Nesse período, Abrams tinha um argumento forte para negar saber das coisas porque ele já havia saído da série para se focar no cinema, comentou Lindelof. “Quando os chefões apareciam na casa dele querendo saber de onde os ursos vinham, ele dizia que deviam perguntar para mim porque ele estava trabalhando em Missão Impossível.”
Lindelof, que tinha decidido sair da série depois de 13 episódios e depois postergou a saída para o fim da 1ª temporada, acabou ficando à frente da série com Cuse até o fim depois de seis temporadas.
O roteirista, eventualmente reconheceu paralelos não intencionais entre a trajetória dele e de Jack, o principal personagem da série. Ele disse que não ficou claro para ele à princípio, que ambos era líderes relutantes lamentando a recente perda de seus pais.
Na terceira temporada, a ABC anunciou que a série duraria seis anos. E o ponto de virada para Lindelof, então desgastado com a pressão, veio no fim daquela temporada quando ele viu Charlie (Dominic Monaghan) morrer. Ele chorou não só pelo personagem, mas pela certeza de que LOST iria acabar.
Ele também disse que a série não teria durado mais que três temporadas sem a internet porque ela permitiu que os fãs e os criadores da série pudessem incentivar uns aos outros. Ele lembrou que 23 milhões de pessoas viram o primeiro episódio e que apenas 13 milhões viram o último, um sinal de que a série perdeu muitos espectadores ao longo do caminho. Contudo, aquele que permaneceram, o fizeram, em parte, porque a internet lhes deu espaço para se expressarem sobre ela, disse ele.
“O que prendeu essas pessoas durante aqueles períodos de dúvidas era a sensação delas de que estavam, de alguma forma, se comunicando conosco”, comentou ele.
Mas, tentar agradar os fãs era um desafio complicado.
“Haviam duas coisas acontecendo na série desde o primeiro minuto. A primeira era que o público realmente queria sentir que exercia um impacto na série. E a outra era o desejo deles de que não estivessemos inventand tudo conforme as coisas iam acontecendo. Todo mundo queria que tivessemos um plano, que já soubessemos exatamente onde queriamos chegar e que não nos desviassemos desse caminho. E o público não percebeu que havia uma enorme contradição entre essas duas ideias. Se você quer influenciar uma história, então não pode existir um grande plano.”
Ele ainda acrescentou: “A série teve que se tornar meio que um exercício de dizer, ‘é disso que falaremos, pessoal. Vamos introduzir os temas e construir os cenários, e uma vez que tudo estiver estabelecido, vocês podem ‘escolher as músicas que querem ouvir e vamos usá-las na trilha’. E foi assim que modulamos as coisas, e isso pode ter funcionado ou não, [dependendo do ponto de vista].
“Mas a interação da internet e nosso desejo genuíno de ouvir o que os fãs estavam dizendo e permanecermos acessíveis aos fãs foi absolutamente essencial para o sucesso da série. Estou totalmente convencido de que provavelmente não teríamos chegado à terceira ou quarta temporadas se a internet não existisse.”
Sobre o trabalho que Lindelof queria em Alias? Nunca aconteceu. A série acabou depois de cinco temporadas em 2006, quatro anos antes de LOST.