terça-feira, 10 de março de 2009

Watchmen: os fins justificam os meios?

Ao contrário de muita gente que só está conhecendo Watchmen agora, me lembro muito bem do impacto que a obra exerceu sobre mim quando a li pela primeira vez há mais de 10 anos. Diferente de quase tudo o que universo dos quadrinhos já ousou explorar, a obra criada por Alan Moore e ilustrada por Dave Gibbons falava de um mundo dominado pelo medo da guerra fria e pela decadência moral de uma sociedade que tinha perdido todas as referências e estava perto do colapso. A guerra fria pode ter acabado, mas a sociedade de hoje não é assim tão diferente da retratada por Moore no anos 80. Sendo assim, será que Watchmen - O Filme poderia ser uma produção relevante?

Leia mais...

    Contando com uma linguagem adulta numa narrativa dominada pelo noir, uma história intrincada e repleta de subtextos contada por personagens não menos complexos e distantes do modelo ‘convencional’ de super herói, Watchmen se consagrou exatamente por inovar e fugir do lugar comum. Com tudo isso em mente, a grande pergunta que ficara no ar depois do anúncio de que a graphic novel ganharia uma adaptação, era se o filme de Zack Snyder (300) conseguiria passar para a tela toda a força que aquela história e aqueles personagens tinham. A resposta pura e simples? Sim. Não que Watchmen – O Filme seja perfeito (pois não o é), mas é inegável que funciona maravilhosamente bem ao reproduzir numa telona, grande parte da magia e do impacto emocional que a história tem.

    Dá para fazer o bem através do mal? Os fins, afinal, justificam os meios? Esses são na minha opinião, os grandes questionamentos da obra de Moore e que Snyder replica no filme de forma consistente. Os principais acertos do filme? (1) A construção de todo o arco que expõe os motivos do assassinato do Comediante é envolvente e exprime todas as boas qualidades de filmes de suspense cujas camadas vão pouco a pouco sendo reveladas. (2) A apresentação dos personagens e de suas histórias se dá de forma fluida e orgânica na história sem atropelos ou exageros. (3) Várias das passagens mais famosas da HQ foram reproduzidas quase que à perfeição. (4) A fotografia traduz com muita competência a ambientação de um mundo que vive sobre a sombra de uma devastação iminente. (5) O bom uso da trilha sonora em grande parte do filme (a abertura ao som de Bob Dylan ficou perfeita). (6) O acerto na maioria das escolhas do equilibrado elenco (Jeffrey Dean Morgan e Jackie Earle Harley estão ótimos como o Comediante e Rorschack respectivamente) e (7) A ‘pequena’ alteração do final do filme em relação à HQ, trouxe um tom ainda mais impactante e porque não dizer, plausível à tudo.

    Mas, se Watchmen – O Filme tem tantos acertos, porque não é perfeito? Simples: a insistência de Snyder em usar o recurso do stop motion (já tão empregado em seu filme anterior, 300) em váriasssss tomadas cansa e é absolutamente desnecessária na maioria delas já que em vez de envolver, acaba funcionando mais como distração boba; a interpretação canastrona de Matthew Goode como Adrian Veidt/Ozymandias diminuindo a importância do personagem no último arco da história, e, finalmente a sutil, mas desnecessária inserção de um ground zero fazendo uma referência óbvia demais ao 11 de Setembro no finzinho do filme. De resto, temos tudo nos devidos lugares. O Comediante manteve o tom amoral e fascista da HQ; o retrato de Rorschach (o melhor personagem da HQ e também do filme) revela-o tão psicopata quanto os criminosos que prendeu/matou; a impressão de que o Dr. Manhattan perdeu a humanidade quando deixou o corpo de Jon Osterman e passou a viver como um semideus usado como arma de guerra e persuasão continua forte e a Spectral, que é tão linda e sexy quanto a HQ sugeria.

    Agora, o grande mérito do filme, fica mesmo por conta de sua capacidade de deixar o convite para que reflitamos sobre a subversão de valores tradicionais. O que era errado antes, pode ser certo hoje e vice-versa? O vigilantismo seria um mal necessário para uma sociedade cada vez mais avessa à regras e que ignora qualquer base moral? Dá para aceitar que em prol de um bem maior, as vidas de alguns milhões sejam sacrificadas para salvar bilhões? Watchmen é um estudo sobre a natureza humana que poucas obras tem coragem de fazer, e como peça de entretenimento, funciona tanto para divertir quanto para fazer pensar. Considerando tudo isso, goste ou não do tema, dá para negar a importância da criação de Moore/Gibbons agora traduzida para a telona por Snyder? Tenho certeza que não, e você?

    Cotação:

8 comentários:

  1. Davi, concordo com você com quase tudo que você disse!

    Definitivamente, a melhor adaptação de uma obra de Alan Moore.

    Só que eu achei o final insatisfatório, apesar de ter passado a mensagem. Ele também foi adequado ao formato (cinema).

    Eu digo que ele foi insatisfatório,pois o Dr. Manhatan não é uma ameaça inteiramente desconhecida. Ele foi um homem, nasceu como todo mundo, e acima de tudo ele é americano. Mesmo os EUA sendo atingindo pelas "bombas-manhatan", algum país culparia os EUA. A união não duraria muito.

    Já uma ameaça alienígena, por outro lado, mexe diretamente com o medo humano do desconhecido, com um inimigo que pode não ter nenhum tipo de lado humano.

    Mas ele foi adequado, a mensagem original foi transmitida (mesmo de forma capenga), e também é muito mais fácil e curto de explicar no cinema, pois o filme não deve ficar muito longo.

    Ah, outra coisa que eu não gostei muito foi que algumas coisas que são subtendidas na graphic novel, são digeridas completamente no cinema. Por exemplo, a capacidade do Manhatan de viver seu passado e futuro.

    A, e aquele "noooooooooooooo" do coruja no final do filme foi totalmente piegas... aff

    :D

    ResponderExcluir
  2. Muito bom o filme, o melhor do ano por enquanto.

    Também fiquei incomodado com o efeito "300" das lutas. Outra coisa, apesar de somente o Dr.Manhattan ter poderes de fato, no filme ficou parecendo que os outros heróis também tinham, diferente da HQ.

    Obs - enquanto o coringa era o nome no filme do Batman, em Watchmen é Rorschach. A sua voz na narração, sua atuação, sua personalidade...

    Obs 2 - Rorschach: "Será não perceberam? Não sou eu que estou preso com vocês, vocês é que estão presos comigo". o.O melhor frase do filme.

    ResponderExcluir
  3. Davi, tem muito filme bom que não tem review aqui no Dude News ainda, gosto de ler os comentários de filmes aqui, fico no aguardo. E quanto a Watchmen, nunca fui fã, mas pelo "arraso" que está sendo, vou conferir ainda no cinema. Abraços.

    ResponderExcluir
  4. Nunca li a HQ, mas como todos sempre falam tão bem da história fiquei curioso e fui assistir.

    Gostei do filme, mas imagino que ele só seja espetacular pra quem tenha lido a HQ. Para mim foi apenas bom.

    Na primeira metade do filme achei Dr. Manhatan o personagem mais interessante, mas depois ele se mostrou um verdadeiro bundão!

    O que adiantou todo seu ar de superioridade se no fim ele foi manipulado pelo Adrian Veidt/Ozymandias, que o enganou dizendo que estava desenvolvendo combutíveis renováveis, mas na verdade estava construindo a bomba no fim do filme? E que herói é esse que deixa uma mulher grávida ser morta pelo comediante?

    Quanto ao final, sei que é uma situação complicada, mas pra mim o fim não justifica os meios. E naquele conflito final entre os personagens, Rorschach teve a atitude mais digna ao não concordar com o sacrifício daquelas pessoas.

    Concordo com o comentário do vitor. A melhor frase do filme é: "Será não perceberam? Não sou eu que estou preso com vocês, vocês é que estão presos comigo".

    ResponderExcluir
  5. Achei o filme muito bom, bem fiel a HQ. A mudança no final ficou ótima.

    O stop-motion foi meio cansativo. O uso dele no filme é muito exagerado, mas as cenas de luta ainda sim são ótimas

    Nem achei o Matthew Goode canastrão, eu acho que é o jeito do personagem mesmo. Não tinha muito pra ele interpretar. Sobre a personagem dele: o Veidt pra mim é o grande herói da história. Mesmo que a solução dele não seja definitiva, ele conseguiu a paz por algum tempo. Ele era o único que sempre teve uma visão maior das coisas, tanto que acreditava que os heróis podiam salvar o mundo. O Rorscharch é que fez besteira mandando o diário pro jornal.

    Não adiantava mais brigar, já estava feito. Se eles contassem o que o Veidt fez, todas aquelas mortes seriam inuteis

    Malucom, o Manhattan não impediu o comediante de atirar por que ele não se sentia obrigado a isso. Ninguém ali é um herói convencional. Se fosse o Superman ali, com certeza ele impediria, mas o Manhattan já estava se afastando das pessoas, principalmente pela forma como ele ve a vida

    ResponderExcluir
  6. Esse Dr. Manhattan não chega nem a ser um herói não convencional. É só um bundão de azul!

    ResponderExcluir
  7. Não cheguei a ler o HQ, mas o filme me surpreendeu em todos os aspectos supracitados no seu review, o grande enredo que apela para temas muito interessantes e atuais, como guerras, o sacrifício de milhões para salvar bilhões, a crise e o colapso mundial são muito bem abordados.

    Parabéns pelo review.

    Abraços,
    Vitor

    ResponderExcluir
  8. Gostei do seu review.
    li o HQ há pouco tempo.. e resolvi ver o filme.. e achei perfeito. Melhor introdução de filme que já vi em toda minha vida. Infelizmente muitos que viram o filme não tiveram uma apreciação completa por não terem lido os quadrinhos antes. Filme muito bom.

    ResponderExcluir

Fale conosco! também pelo e-mail mandando sua sugestão ou crítica.

Comentários ofensivos ou que não tenham relação com o post serão recusados.