terça-feira, 25 de agosto de 2009

MAD MEN 3x1: "Out of Town"

Comentário de episódio exibido no dia 16 de agosto nos EUA


A segunda temporada de Mad Men terminou com duas cenas ao mesmo tempo fortes e delicadas. Em uma delas, Peggy Olson revelou a Pete Campbell que havia engravidado dele e que tinha passado o bebê adiante. Se nós telespectadores já fomos pegos de surpresa com a gravidez bizarramente bem escondida (não sei vocês, mas o mais perto que cheguei de adivinhar algo foi ter a impressão de que a atriz tinha engordado um pouco), imagine só o que sentiu o pai da criança, que momentos antes tinha deixado claro a quedinha que tem pela moça. O alívio de Peggy em quebrar o segredo contrastava com a angústia de Peter em lidar com a novidade. E uma mudança na dinâmica entre eles parecia de antemão escalada como um carro-chefe da terceira temporada.

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    Na outra cena, Don Draper descobre que Betty está à espera de mais um herdeiro. O que em outras séries ganharia ares de redenção, com lágrimas e sorrisos incontidos e possíveis palpites sobre o sexo da criança, em Mad Men ganhou a abordagem mais natural possível. Afinal, um casamento estremecido não é o melhor cenário para se trazer uma nova vida ao mundo. Com a cena, não ficava claro se Draper estava perdoado pelas suas puladas de cerca, e mais do que isso, pela indiferença com que tratava as inquietações silenciosas da esposa. Mas que Betty teria de aceitá-lo de volta à sua vida para aguentar essa barra, não havia dúvidas. Lembremos também que naquela época seria um escândalo que um homem engravidasse a eposa com quem já tinha dois filhos e se separasse dela em plena gestação do terceiro. Mais do que um gancho para a temporada seguinte, tínhamos aí um desfecho para a trama principal do segundo ano de Mad Men.

    Na volta aos trabalhos, vemos Don sonhando acordado, como se estivesse presenciando de sua cozinha o ato inaugural de sua vida. A mãe adotiva de Don (ou melhor, de Dick Whitman, sua verdadeira identidade) dá a luz a um bebê natimorto. Já sua mãe biológica, uma prostituta, arcou com uma gravidez indesejada, ao aceitar transar sem preservativo por uns trocados a mais do que o "preço de tabela". Nove meses depois estaria parindo, tremendo de dor e ameaçando para quem quisesse ouvir que ia arrancar as partes íntimas daquele cliente e fritá-las no óleo quente. Desnecessário dizer que criar o bebê estava fora de cogitação para ela. A parteira então bate à porta dos Whitman, dando novo lar à criança abandonada. A mãe de criação de Don reage quase hipnoticamente ao argumento "eu lhe disse que Deus lhe daria outra criança", e segue com o bebê para dentro de casa. O resto é história.

    Oras, ele foi um bebê passado adiante. Como poderia abandonar o seu? E ao sair do transe com o leite derramando no fogão, Don volta para o quarto, onde Betty sofre os efeitos da gravidez, já com um barrigão à mostra. Não se sabe ao certo quanto tempo passou (a não ser que você saiba ler uma barriga de grávida, o que, peço desculpas, não é minha especialidade), mas fica claro que o afeto entre o casal foi recuperado. A dedicação do "pai do ano" seria colocada à prova no dia seguinte, quando Don viajaria acompanhado de Salvatore para uma reunião de trabalho em Baltimore. No avião (onde todos fumavam e bebiam loucamente, claro), a aeromoça quase se jogou no colo dele e praticamente intimou Draper e seu colega a jantarem com ela, uma outra aeromoça e o piloto da aeronave. Se durante a refeição Sal não deu muito bola para a coleguinha (embora também não tenha dado bola para o piloto), Draper não fez muito esforço para se livrar de Shelly, a assanhada.

    Quando ela diz que é noiva, mas que está tentada porque essa pode ser sua "última oportunidade", o incorrigível Don arremata com "Eu sou casado. Sempre haverá oportunidades". O resto é aquilo que você já estava esperando. Com uma pequena reviravolta: soa o alarme de incêndio do hotel. Mas o que pra eles foi um pequeno contratempo, para certa pessoa gerou uma bela de uma saia justa. Enquanto Don se dava bem em outro andar, Salvatore chama alguém para consertar o ar-condicionado do seu quarto e, numa prova de que o tal de gaydar precede a TV a cores, é agarrado pelo funcionário do hotel. O coito homossexual tão sonhado por ele é interrompido pelo outro tipo de fogo. E então aparece Don, pela escada de incêndio, chamando Salvatore e se deparando com seu amigo e um outro rapaz "se recompondo" a fim de abandonar o hotel. Don nada comenta. Por enquanto.

    Abro parênteses aqui para comentar algo que sempre me empolga na série: o gênio criativo de Draper. A reunião em Baltimore é com a London Fog, uma empresa tradicional, que vende capas de chuva. Primeiro Don mostra seu já conhecido poder de persuasão. O filho do dono da empresa quer convencer o pai a diversificar, vendendo chapéus, guarda-chuvas e bolsas. Don é rápido e conciso: a London Fog é um nome que vem à cabeça do consumidor quando ele pensa em capas de chuva. O negócio pode ter anos bons e anos ruins, mas vai se manter. Afinal: vai chover. Isso sem contar a brilhante ideia que Don tem para a nova campanha da marca, a qual é apresentada na volta para NY, dentro do avião. Ideia essa apresentada em um momento onde Sal (e muitos telespectadores, aposto) suaram frio, achando que Don o abordava para perguntar sobre o que vira na noite anterior. Não foi dessa vez. Ao menos por enquanto.

    Contrariando minhas expectativas, Pete e Peggy não dividiram cenas nesse episódio de estreia. O processo de amadurecimento dele, que parecia iminente, ou foi adiado, ou desviado por algo que tenha acontecido nesses meses que a série não mostrou. Algo que pode vir à tona para nós reles telespectadores num futuro próximo. Pelo contrário, o episódio mostrou mais uma vez o quanto a ambição de Campbell o torna imaturo. Convidado a assumir o cargo de diretor de contas da Sterling Cooper e aconselhado a manter discrição, ele se encheu de garbo, cantou vitória para a esposa e nos presenteou com uma patética (e deliciosa) cena na qual divide um elevador com Ken Cosgrove. Com ar superior, Pete elogia o trabalho do colega e diz que faz questão de recomendá-lo sempre, já dando a entender que a sua opinião teria um peso maior dali para frente.

    Mal sabia Campbell que Cosgrove também havia sido promovido para o mesmo posto e que eles dividiram ao meio os clientes da agência. Feliz e satisfeito, Ken acabaria confrontado por Pete, que usa então o argumento mais feio, bobo e cara de melão possível: "Você não deveria querer essa promoção, porque você não é bom". Se há um porém nesse episódio, talvez seja o fato do Campbell que nele aparece não tenha demonstrado nenhuma mudança com relação ao Campbell que tomou uma verdadeira porrada no encerramento do episódio anterior. Mas como nada é entregue de mão beijada à audiência de Mad Men, convém esperar o desenrolar da temporada antes de carimbar isso como um deslize.

    Também algumas subtramas ganharam espaço, todas envolvendo conflitos profissionais dentro da agência, recém-adquirida pelos britânicos da Putnam, Powell and Lowe. Os funcionários da Sterling Cooper continuam temendo demissões, como a do antigo gerente de contas, que deu um "showzinho" na hora de se despedir. Com direito a ameaças proféticas e vasos derrubados das mesas das secretárias da firma. Roger Sterling e Bert Cooper ainda parecem estar tentando se acostumar à invasão britânica na agência. Menos por revolta e mais por lá figurarem sem muitos poderes. Como se diz por aí, eles agora mandam tanto quanto, ironia à parte, a rainha da Inglaterra. Sterling jocosamente dá de ombros por não ter suas opiniões levadas em consideração: "eles não entendem o nosso sotaque".

    E unindo as categorias "secretárias" e "invasão britânica", aparece um novo personagem, John Hooker, que parece que vai dar muita dor de cabeça. Ele se diz "representante" da agência-mãe e se recusa a ser tratado como um secretário, pedindo até para funcionárias encantadas com seu sotaque fazerem seu trabalho de datilografia. Ao ser chamado informalmente de John por Joan, ele exige ser tratado como Mr.Hooker. Ela, meio que pra se livrar desse chato, lhe arranja o escritório do diretor de contas demitido. Para desgosto de John (chamei pelo nome de propósito), seu superior decide que a ideia de uma sala para receber os conterrâneos é boa, mas que ele deve mesmo é ficar do lado de fora, na porta... como um secretário. Ao reclamar dele para Joan, Peggy traz à tona o brilhante apelido que o rapaz ganhou nos bastidores da firma: Moneypenny, que pra quem não ligou o nome à pessoa, é a secretária de M., chefe de James Bond.

    Tomando por base o primeiro episódio da temporada, ainda não dá pra saber qual será o principal enredo da trama. Mas levando em consideração que nas outras temporadas também não sabíamos onde Matthew Weiner (o criador e manda-chuva do programa) queria chegar, e que no final ele sempre nos levou a tramas muito bem resolvidas, é melhor nem se preocupar e apenas curtir mais um trecho dessa viagem pelos charmosos anos 60. A audiência da série é modesta e dificilmente subirá a essa altura dos acontecimentos, mas fica a impressão de que tanto a crítica, quanto sua fiel base de fãs continuarão satisfeitos. E se você não gosta da série e não consegue entender porque a chuva de elogios a ela continua caindo, é bom se conformar. Não há o mínimo sinal de estiagem no ar. Como profetizou Don Draper: vai chover.


2 comentários:

  1. Ótimo comentário para uma das séries mais deliciosas produzidas no momento. Acho válido apenas complementar que o Cooper disse ao Campbell sobre uma "pequena" campanha da prefeitura chamada "Penn Station" que, para muitos brasileiros, pode ter passado batido, mas trata-se da mega-campanha que aconteceu que mudou a Madison Avenue para Madison Square Garden com a construção de prédios bem famosos hoje em dia. Um marco em NY. Será uma promessa de que o Campbell vai mostrar que realmente tem algum valor? A confeir!

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  2. Foi um prazer rever MAD MEN e tambem ler essa completa e divertida resenha sua.

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